São os saltos altos que marcam o ritmo da noite. Os vestidos arrastam-se na avenida La Croisette. Brilhantes, sem costas, de alças, decotados. Compridos, curtos, pretos, coloridos. Todas as mulheres são belas. Os homens charmosos.
Os aromas enroscam-se nos smokings e sobem até às estrelas. Naquela passerelle desfilam famosos, conhecidos, anónimos. Uns vão com pressa para o cocktail que já começou, outros apressam-se para a projecção que vai começar. Na rua desfilam os carros: Bentley, Rolls Royce, Lamborghini, Ferrari.
De um lado a praia, do outro uma montra de ilusão. Dior, Prada, Valentino, Gucci, Chanel… Um vestido preto esconde o busto de madeira que lhe serve de medida ao preço – 1 100 euros. No chão, uma mulher de rugas vincadas (de certeza nunca fez uma plástica, nem usou botox) embala uma criança adormecida pela mistura doce dos perfumes. Tem a mão direita estendida, suja, calejada da vida. Num pedaço de cartão, talvez de transportar o vestido da montra, misturam-se as siglas e as palavras no entendimento humano:
“S. V. P. Sans-Abri”.
23 de Maio de 2006